quinta-feira, 21 de junho de 2012

A.Grade (n.1961)
Entre Lisboa e Porto, Londres e Nova Iorque, eléctricos e autocarros percorrem-nas de noite e de dia, em movimentos desiguais, contudo constantes. Realidades silenciosas, abertas a novos mundos.Tudo na obra de Abel Grade se confunde com o real, pela transparência das linhas e reflexos dos objectos.

Com uma iconografia própria, construída a partir da memória visual composta por imagens, viagens, lugares e pessoas, proporciona episódios comuns onde a singularidade é atingida pelo tratamento da luz. Intensa e quente em ambientes nocturnos, dando alma à boémia como em Para sempre…”, realçando pormenores, sugerindo pontualmente a ideia de movimento e dinamismo (Electrico no Tempo ). Suave e translúcida durante o dia. Em “Manhã nos Jerónimos”, e Estação de São Bento, a luz penetra por entre os arcos e os janelões criando uma aura mística em torno dos espaços retratados. Num perfeito jogo de sombras, a luz é igualmente condutora da leitura compositiva, e monitora da acção.

Não ignorando contudo pontuais revisitações imprevisíveis (ou espontâneas) à atmosfera romântica, também presente em “Voando na rebentação”, pelo esquema de composição física e cromática, pela fidelidade ao detalhe e efeitos estilísticos, há que ter em atenção à propensão do pintor para uma relação desequilibrada entre o interior e exterior. Aqui nasce o jogo criado entre o autor e o espectador, pelo desafio que é gerado em consciência de abrir novas perspectivas de interpretação à sua obra. À representação do essencial da realidade concreta e visível, seja urbana ou marítima, contrapõe-se uma realidade subjectiva originada por apontamentos ocasionais de factos ou pela omissão de matéria. Neste sentido, E. Hopper já não mora aqui “, mais do que a homenagem ao realista norte-americano, é o culminar desta ideia. À estaticidade inerente aos diferentes quadros de personagens, pressupostos habitantes do edifício,opõe-se um dinamis mo frenético de automóveis e pessoas que se movem na cidade. Desta forma, o público é convidado pelo artista a tornar-se testemunha do seu processo criativo.Mais do que invocações históricas ou memórias, a obra de Abel Grade tematiza uma vasta panóplia de situações, reais ou ficcionadas, de culto às cidades e ao mar, o fascínio pela luz nocturna, o encontro de quadros “Bruma no Cais” e “ Loveness “ , a tensão entre o antigo e o moderno (Eléctrico no Tempo). O conteúdo é simples e revela a persistência em mostrar o invisível através do visível.
Daniela Palitos – Crítica de arte
( Licenciada em História, variante História da Arte pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa)

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